Minha Cidadania Italiana

Do Império Austro-húngaro à Itália: O Meu processo de reconhecimento da cidadania italiana para Trentinos

Quero trazer um panorama histórico importantíssimo para o reconhecimento da cidadania italiana. Afinal de contas, as diversas transformações políticas e territoriais da Europa ao longo dos anos mudaram fronteiras e até levaram à criação de novos países.

A Itália, por exemplo, anexou alguns territórios que faziam parte do Império Austro-Húngaro. Esse fato histórico levanta dúvidas sobre o reconhecimento da cidadania italiana para aqueles que nasceram nos locais que foram incorporados.

Até hoje, existe certa confusão sobre a cidadania dos nascidos no império e seus descendentes. Portanto, compreender essa questão foi fundamental para o conhecimento das minhas raízes familiares, além de ser um passo importante para garantir meus direitos.

Neste texto, vamos explorar como esse passado influencia o reconhecimento da cidadania italiana no presente.

O que foi o Império austro-húngaro?

Antes de falarmos sobre o reconhecimento da minha cidadania italiana, precisamos trazer um panorama de informações sobre o império austro-húngaro.

A Áustria-Hungria, conhecida também como Império Austro-Húngaro, foi uma monarquia multinacional na Europa Central com capitais em Viena e Budapeste. O Estado surgiu de uma aliança entre os nobres austríacos e húngaros entre 1867 à 1918.

Com seus 621,583km2 de extensão, o império era o segundo maior país da Europa na época e foi uma das maiores potências do continente. Durante seus 51 anos de existência, a Áustria-Hungria se destacou no cenário industrial mundial por diferentes motivos:

• Construiu a quarta maior indústria de construção de máquinas do mundo, seguindo os Estados Unidos, Alemanha e Reino Unido;
• Tornou-se a terceira maior fabricante e exportadora global de eletrodomésticos, equipamentos elétricos industriais e geradores para usinas de energia;
• Desenvolveu a segunda maior rede ferroviária da Europa, superada apenas pelo Império Alemão.

O Império Austro-Húngaro foi dissolvido em outubro de 1818, no final da Primeira Guerra Mundial. Como resultado, houve a assinatura do Tratado de Saint-Germain-en-Laye, setembro de 1919, o qual entrou em vigor em 16 de julho de 1920. Este documento tem grande importância histórica, pois levou à divisão do Estado nos seguintes países:
• Áustria;
• Hungria;
• República Checa;
• Eslováquia;
• Eslovênia;
• Croácia;
• Bósnia e Herzegovina.

Também estavam sob o poder da monarquia regiões da Itália, da Sérvia, de Montenegro, da Romênia, da Polónia e da Ucrânia.

Quais territórios italianos fizeram parte do Império Austro-Húngaros?

As regiões de Trento, Bolzano e Gorizia foram anexadas à Itália após a assinatura do tratado, em 1919, formando o Trentino-Alto Ádige. Após 1920, os seguintes territórios passaram a integrar a Itália:
• Toda a província de Bolzano (Tirol do Sul);
• Toda a província de Trento (Tirol italiano);
• Além disso, toda a província de Gorizia;
• Toda a província de Trieste;
• Quinze municípios da província de Udine (Aiello del Friuli, Aquileia, Campolongo al Torre, Cervignano del Friuli, Chiopris-Viscone, Fiumicello, Malborghetto-Valbruna, Pontebba, Ruda, San Vito al Torre, Tapogliano, Tarvisio, Terzo di Aquileia, Villa Vicentina e Visco);
• Três municípios da província de Belluno (Cortina d’Ampezzo, Colle Santa Lucia e Livinallongo del Col di Lana);
• Um município da província de Vicenza (Pedemonte e a comuna extinta de Casotto);
• E ainda, dois municípios da província de Bréscia (Magasa e Valvestino).

As pessoas que nasceram em qualquer local dessa lista são chamadas de Trentinos. E, até hoje, sua origem austro-húngara causa confusões para descendentes que querem o reconhecimento da cidadania italiana.

Como ficou o reconhecimento da cidadania italiana para quem nasceu no Império Austro-Húngaro?

Com o fim do império, a cidadania austro-húngara deixou de existir, então foi preciso garantir o reconhecimento dos novos países. Os moradores que permaneceram no Trentino não encontraram dificuldades para obter a Cidadania Italiana. No entanto, as pessoas que emigraram não conseguiram comprovar sua origem na região. E dessa forma, elas passaram a ser consideradas imigrantes pelo governo italiano.

Somente em 2000 o Parlamento Italiano aprovou uma lei que garantiu o reconhecimento da cidadania italiana aos Trentinos e aos seus descendentes. Porém, o prazo para solicitar a cidadania foi limitado até dezembro de 2010. Inclusive, alguns dos processos daquela época ainda estão em andamento.
Quem perdeu a data não pode mais requerer a cidadania por via administrativa. A única opção, seria entrar com um processo judicial perante a Justiça italiana. Ainda assim, não há garantias de sucesso. Já os emigrantes dos territórios já pertencentes ao Império Austro-Húngaro que não optaram pela nacionalidade italiana tornavam-se apátridas.

E hoje? Os descendentes de Trentinos têm direito ao reconhecimento da cidadania italiana?

De uma forma simples e direta, a resposta é: depende. Isso porque existem diferentes casos ligados a concessão de cidadania para quem decente de Trentinos.

Como falei anteriormente, houve um prazo para solicitar o reconhecimento da cidadania italiana. Portanto, quem é descendente de familiares que moravam nas regiões anexadas pela Itália em 1919 e não fez o pedido até dezembro de 2010, provavelmente não conseguirá obter a cidadania.
Atualmente, há pressões políticas para flexibilizar essa questão, mas sem nenhum indício de mudanças no futuro próximo.

No entanto, se o seu ascendente trentino nasceu após 1920, ele já é considerado cidadão italiano. Nesse caso, você poderá fazer o pedido de reconhecimento da sua cidadania sem maiores problemas.

Para antepassados nascidos no território austro-húngaro antes de 1920, foi o meu caso, é preciso comprovar que o antepassado saiu do território após a incorporação do território à Itália, ou seja, após 16 de julho de 1920. Tal comprovação se dá, por exemplo, com a apresentação da certidão de desembarque do antepassado em território brasileiro.

O que é necessário para ter o direito à cidadania italiana?

Na cidadania jus sanguinis o direito é transmitido aos filhos de italianos, sem interrupção e sem limite de gerações. Ou seja, se um dos seus antepassados (avós, bisavós, trisavós, tetravós, etc. era italiano, você pode entrar com o processo de reconhecimento de cidadania.

Para comprovar o vínculo, basta apresentar documentos como certidões de nascimento, de casamento e de óbito de todas as pessoas que lhe transmitem o direito.

Outro documento necessário é a Certidão Negativa de Naturalização, para comprovar que seu ascendente não foi naturalizado brasileiro.

Enfim, espero que tenham entendido como foi difícil este meu processo. Iniciei em 2012 e conclui em 2020, ou seja, 8 anos de muita pesquisa e dedicação. Valeu cada momento vivido, cada viagem à Itália para resgatar minhas origens. Hoje sou cidadão Italiano com muito orgulho.

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